quarta-feira, 25 de agosto de 2010

O Rito

As luzes estão azuis, o palco está enevoado. No centro está o casal principal, futura sacerdotisa e futuro sacerdote ambos de branco e ornados de ouro. Ao redor deles no centro do palco estão os sacerdotes mais velhos, vestidos de túnicas escuras e observando o jovem casal. A música é calma. Abrem-se as cortinas. A jovem ninfa pergunta:

- O que você faria se eu dissesse que quero te dar agora?

Os experientes sacerdotes se olham com aquiescência e se retiram do palco. Novos jorros de fumaça inundam o palco, a luz torna-se vermelho vivo. Entram no fundo do palco jovens ninfas que junto da música começam a dançar; dá-se inicio ao rito.

Assim, começa a coreografia de Dionísio. A ninfa e o mancebo deitam-se em lençóis por hora brancos e dançam o ritual dos corpos sedentos, o ritual de querência mútua, o ritual da carne. Encenam com maestria e perfeição a mais bela ode a Baco, um hino a Dionísio.
Amor e ódio, desejo e proibição, lascívia e timidez são os ingredientes para a química do amor simplório, fundindo-se com perfeição na mais bela antítese da vida humana.
Suor e lágrimas, dor e prazer são os compassos da partitura que reje os principiantes amantes enlaçados no fascínio que é a satisfação do apetite vivaz e virginal. Elementos que geram a sinestesia entre corpos e almas.
O rito vai dando certos, os passos antes inseguros já são dados com a firmeza e a vontade necessárias. O climax é eminente, os amantes já banhados pelo único e puro líquido da virgindade feminina se preparam para o momento mais belo, o momento de confirmação de suas escolhas, o encontro com Dionísio onde deixam se serem ninfas e mancebos e tornam-se sacerdotisas e sacerdotes da mais bela e antiga arte da vida. Venha Dionísio! Venha o prazer! Venha o gozo! Venha a confirmação!

As luzes vão enfraquecendo, os amantes dançam em compassos mais lentos e cansados, as ninfas bailarinas interrompem a coreografia de fundo. Os amantes se desentrelassam ao ritmo da respiração animal. A luz apaga e aos poucos retorna, dessa vez ela volta a ser azul. O casal encontra-se nu, deitado e coberto sob lençóis não mais brancos, mas sim vermelhos.

A expressão é de contentamento, os novos sacerdotes trocam tímidas carícias, mal se conhecem! Se locupletam em desejo, mas não comungaram em alma.São amantes sinceros, amantes da dança, amantes do momento.
Vencidas as barreiras do tempo, do medo e da fama, os belos amantes se levantam nus, visivelmente exaustos, e caminham para o fundo do altar de Baco.
São únicos um para o outro, serão eternos em lembranças. Passado e dado o primeiro passo, estão prontos para dançarem como novos pares, ou com vários parceiros, estão prontos para praticarem o culto ao corpo em novos tempos e em outros templos.

Ao chegar ao fundo do palco, os sacerdotes iniciados se despedem, cada um escolheu para si uma direção. Após um rápido e tímido beijo, cada um segue o seu caminho ao som de uma música alegre e vivaz, deixando claro que é o fim da peça, mas também o início da vida.

Fecham-se as cortinas

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